Recanto Clínica Hospitalar – Um lugar de reencontro!

Atendimento 24 horasLigue agora! 4007-2316

A Ilusão da Última Vez – Autossuficiência da dependência química

Luta contra a dependência

Na jornada de quem sofre com a dependência química, uma das crenças mais traiçoeiras é a chamada “ilusão da última vez”. Trata-se da convicção, muitas vezes silenciosa, de que a próxima dose será a última, de que o próximo trago, baseado, pílula ou pico será a despedida definitiva. 

Essa ilustração mental, recheada de autoconfiança, mascara uma realidade cruel: a de que, sozinho, raramente o dependente consegue romper com o ciclo da compulsão.

Promessa

A promessa que nunca se cumpre

A ilusão da última vez se constrói como um mecanismo de defesa. Diante da culpa, da vergonha, do medo e das perdas acumuladas, o dependente alimenta a ideia de que está no controle. 

Esse pensamento oferece alívio momentâneo: “Só mais hoje, amanhã paro.” Contudo, o amanhã nunca chega. E, quando chega, a vontade de usar continua lá, mais forte que a determinação passageira.

Essa promessa não cumprida se torna cíclica. Reforça o sentimento de fracasso e a crença limitante de que o usuário não tem valor ou força suficiente. Com isso, o ciclo de recaída se intensifica.

A raiz psicológica da ilusão

Do ponto de vista cognitivo-comportamental, a ilusão da última vez está diretamente relacionada às distorções cognitivas. Segundo Beck e outros autores da TCC, o dependente desenvolve padrões de pensamento automáticos, como a superestimação do autocontrole e a negação das consequências negativas.

Outro aspecto importante é o reforço positivo imediato promovido pela substância. A recompensa rápida — prazer, alívio da ansiedade, fuga emocional — reforça o comportamento, mesmo que as consequências negativas sejam evidentes.

A autossuficiência como armadilha

A crença de que é possível sair sozinho da dependência, sem ajuda terapêutica, sem apoio familiar, sem comunidade ou espiritualidade, é muitas vezes alimentada pelo orgulho, pela vergonha ou pelo medo de julgamento.

No entanto, a literatura e a experiência clínica demonstram que a autossuficiência é uma ilusão perigosa.

A recuperação é um processo complexo, que exige suporte multidisciplinar, intervenções psicoterapêuticas, redes de apoio, e muitas vezes, internação em comunidade terapêutica. Negar isso é se colocar em risco de recaída constante.

Narcóticos e Alcoólicos Anônimos: o fim da ilusão

Os programas de 12 passos, como Narcóticos Anônimos (NA) e Alcoólicos Anônimos (AA), têm um papel fundamental na desconstrução da ilusão da autossuficiência. O primeiro passo é justamente admitir que se perdeu o controle sobre a substância. Esse reconhecimento é libertador porque rompe com o ciclo de negação.

Ao participar de grupos de apoio, o dependente se vê no outro, encontra identificação, acolhimento e, acima de tudo, um plano de ação. Deixa de lado a crença solitária de que conseguirá parar sozinho e descobre a força da partilha.

A necessidade da intervenção

Intervir precocemente na ilusão da última vez pode evitar tragédias. Familiares, amigos, terapeutas e profissionais da saúde devem estar atentos a falas como:

  • “Eu sei o que estou fazendo.”
  • “Deixa comigo, dessa vez é diferente.”
  • “Não preciso de ajuda, é só uma fase.”

Essas expressões são sinais de alerta. Uma abordagem empática, firme e sem julgamento pode abrir espaço para o diálogo e o encaminhamento para tratamento adequado.

A recaída como parte do processo

É importante lembrar que recaídas podem ocorrer. E elas não significam fracasso, mas sim que algo no plano de recuperação precisa ser ajustado. A recaída, inclusive, pode reativar a ilusão da última vez, tornando ainda mais urgente o suporte e a orientação profissional.

Caminhos para romper a ilusão

  • Psicoterapia: Em especial a terapia cognitivo-comportamental (TCC), que ajuda a identificar e reestruturar pensamentos distorcidos.
  • Internação terapêutica: Em casos mais graves, a permanência em ambiente protegido é essencial.
  • Grupos de apoio: Compartilhar experiências com outros dependentes em recuperação fortalece o compromisso com a sobriedade.
  • Espiritualidade e propósito: Sentir-se parte de algo maior, redescobrir valores e metas existenciais ajudam na manutenção da abstinência.
Mudança

Quando a mudança começa de verdade

Muitos dependentes relatam que o momento de virada ocorreu quando deixaram de acreditar que podiam sozinhos. Quando admitiram sua vulnerabilidade e pediram ajuda, abriram-se as portas da mudança. 

Não se trata de fraqueza, mas de coragem. Encarar a realidade, aceitar limitações e agir a partir disso é um ato de profunda força interior.

Além disso, o rompimento com a ilusão da última vez possibilita a construção de novos hábitos, rotinas saudáveis, reconstrução de vínculos afetivos e, com o tempo, uma nova identidade baseada em sobriedade, dignidade e sentido de vida.

Como familiares e amigos podem ajudar

  • Evite julgamentos. Frases como “isso é falta de vergonha” apenas reforçam a culpa e o isolamento.
  • Esteja disponível. Ofereça apoio real: ouvir, acompanhar, buscar profissionais.
  • Informe-se. Entender como funciona a dependência ajuda a lidar com ela de forma mais eficaz.
  • Cuide-se também. Familiares sofrem junto e precisam de suporte, como grupos de apoio para co-dependentes.
Reconstruir

Reconstruindo o amanhã: um passo por vez

Romper com a ilusão da última vez é mais do que interromper o uso da substância. É redirecionar a vida, ressignificar dores e reencontrar propósitos. O dependente precisa ser convidado a imaginar um amanhã diferente — e, acima de tudo, ser apoiado na construção desse novo futuro.

É importante destacar que a recaída muitas vezes está associada à falta de ferramentas para lidar com o estresse, conflitos emocionais ou mudanças bruscas de rotina. Por isso, estratégias de enfrentamento são fundamentais. 

Técnicas de respiração, meditação, atividade física regular e engajamento em atividades prazerosas são exemplos de práticas que auxiliam na manutenção da abstinência.

Além disso, o acompanhamento contínuo com profissionais da saúde mental permite o monitoramento de gatilhos e o ajuste de estratégias conforme a evolução do paciente. O acolhimento empático, a escuta ativa e a validação emocional são recursos valiosos nesse processo.

Histórias que inspiram a mudança

Em muitos centros de reabilitação e grupos de apoio, escutam-se histórias de pessoas que um dia disseram: “É a última vez”, mas que só encontraram libertação quando assumiram que precisavam de ajuda. Essas narrativas têm um poder transformador: inspiram, motivam, despertam consciência.

É por meio da partilha que se cria rede, e por meio da rede que se constrói o alicerce da sobriedade. O dependente deixa de ser apenas um usuário para se tornar um ser humano em recuperação, com sonhos, desejos e capacidades.

A importância do tempo na desconstrução da ilusão

Desconstruir a ilusão da última vez não é um processo imediato. Leva tempo, paciência e persistência. Cada pequeno avanço conta. O mais importante é entender que não se trata de uma mudança repentina, mas sim de uma jornada contínua e gradativa.

A consciência de que a recuperação é um processo progressivo ajuda o dependente a aliviar a autocobrança, evitando sentimentos de frustração. Nesse cenário, celebrar as pequenas vitórias torna-se essencial: um dia limpo, uma semana, um mês. Cada marco deve ser valorizado, pois ele representa resistência e transformação.

O papel da educação emocional

A maioria dos dependentes químicos desenvolveu, ao longo da vida, um repertório emocional fragilizado. Muitas vezes, não aprenderam a nomear sentimentos, expressá-los de maneira saudável ou lidar com frustrações. 

Investir na educação emocional durante a recuperação é essencial para evitar que recaídas futuras se manifestem diante de dificuldades cotidianas.

Terapias que envolvem mindfulness, DBT (terapia dialética comportamental), arteterapia ou grupos de expressão emocional têm se mostrado eficazes nesse sentido. Elas promovem autoconhecimento, autorregulação e fortalecimento da autoestima.

Nossos tratamentos

Prevenção de recaídas: estratégias essenciais

Um plano de prevenção de recaídas eficaz envolve identificação de gatilhos internos e externos, mapeamento de situações de risco e elaboração de respostas alternativas saudáveis. 

Também é fundamental desenvolver um plano de emergência: uma lista de ações e contatos a recorrer caso a vontade de usar surja com intensidade.

Ter um terapeuta de referência, um padrinho/madrinha em grupos de 12 passos e uma rotina estruturada são fatores protetores. Quanto mais o dependente compreende o funcionamento do seu ciclo de uso, mais ferramentas ele adquire para interrompê-lo.

O poder do propósito e da reconstrução

Muitos relatos de superação mostram que encontrar um propósito é a chave para a sustentação da sobriedade. Isso pode vir na forma de um novo projeto de vida, retomada de estudos, voluntariado, fortalecimento espiritual, reconexão com a família ou o nascimento de uma nova motivação.

Recuperar-se de uma dependência não é simplesmente voltar a ser quem era antes. É se transformar. É viver um renascimento pessoal. 

A desconstrução da ilusão da última vez é, portanto, a abertura para essa nova fase, onde o dependente não é mais dominado pela promessa do “só mais uma vez”, mas guiado por metas reais, valores renovados e um compromisso contínuo com a própria vida.

Conhece alguém ou está precisando de ajuda?

Considerações finais

A ilusão da última vez é uma das expressões mais perigosas da dependência química. Ela perpetua a negação, retarda o tratamento e fortalece o ciclo da compulsão. Reconhecê-la como armadilha é o primeiro passo para a verdadeira liberdade.

Se você ou alguém que você ama tem repetido essa promessa silenciosa de que agora vai parar sozinho, busque ajuda. O Grupo Recanto está aqui para acolher, orientar e caminhar ao seu lado na jornada de recuperação.

✏️ Quer saber mais sobre tratamentos eficazes e personalizados para dependência química? Acesse www.gruporecanto.com.br e converse com um de nossos especialistas. Sua recuperação começa com um primeiro passo. Não precisa ser sozinho.

NÓS LIGAMOS PARA VOCÊ

Fabrício Selbmann é psicanalista, palestrante sobre Dependência Química e diretor da Recanto Clínica Hospitalar – rede de três clínicas de tratamento para dependência química e saúde mental, referência no Norte e Nordeste nesse segmento.

Especialista em DependênciaQuímica pela UNIFESP, pós-graduado em Filosofia | Neurociências | Psicanalise pela PUC-RS, além de especialização na Europa sobre o modelo de tratamento Terapia Racional Emotiva (Minessota).

Posts Recentes